Fichamento de artigo de Samyra Crespo: Educar para a sustentabilidade

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CRESPO, Samyra. Educar para a sustentabilidade: a educação ambiental no programa da agenda 21. In NOAL, F.O.; REIGOTA, M. & BARCELOS, V.H.L. (orgs.). Tendências da educação ambiental brasileira. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.

“Em termos gerais, o pensamento sobre a função social da educação divide-se em duas principais correntes: a) a que vê a educação como transmissão, ensino de conteúdos sistematizados ao longo de gerações, cujo principal objetivo é formar cidadãos adaptados, aptos a lidar com o sistema sócio-cultural e econômico onde se inserem; b) a que entende a educação como aquisição de um sistema amplo e dinâmico de conhecimentos que não são adquiridos exclusivamente através da escola, ou pela grade curricular do chamado ensino formal, e que visa formar indivíduos críticos, capazes de entender o mundo e a cultura onde vivem, orientando suas ações por um padrão ético e por ma inteligência questionadora”.” (Crespo, 2000: 213).

“encarnam dois diferentes modelos: a) o modelo tecnicista-, profissionalizante, voltado em seus graus superiores para as demandas do mercado de trabalho; b) o modelo humanista, que enfatiza a formação individual, o dom e a vocação da pessoa, em que a ciência, a arte, a filosofia, a história, fazem parte de um legado civilizatório.” (Crespo, 2000: 213).

“o que temos hoje, em termos de uma tendência dominante na educação é a tentativa de combinar ambos os modelos. (…) há um consenso generalizado de que as escolas (…) não podem, de um lado, dar às costas a um mundo cada vez mais exigente em termos do domínio das tecnologias e regido pela alta competitividade. (…) De outro, não pode permitir o engessamento da cultura nem o encurtamento das capacidades criativas.” (Crespo, 2000: 214).

“Como situar a educação ambiental (…) nesta tendência geral de buscar-se uma síntese entre os modelos acima mencionados?” (Crespo, 2000: 214).

“Uma das concepções correntes é a de que a educação ambiental é apenas um recorte especializado da educação em geral” (Crespo, 2000: 214).

“Para essa corrente, trata-se de agregar e transmitir mais um conteúdo exigido seja pelo avanço tecnológico, seja pelo alargamento do espectro de problemáticas ocorridas nas sociedades contemporâneas” (Crespo, 2000: 215).

“Na escola, onde prevalece o modelo tecnicista, a educação ambiental tem de ser vista como disciplina ou parte de uma disciplina, e aí a Biologia e a Geografia aparecem como as disciplinas vocacionadas” (…) são valorizados os conceitos científicos da ecologia e a natureza é vista como ‘recursos naturais’ renováveis e não renováveis” (Crespo, 2000: 215).

“Na escola, onde predomina o modelo humanista, a educação ambiental tende a ser vista como uma discussão ética em primeiro plano (…) discute-se o próprio padrão civilizatório adotado pelas sociedades ocidentais” (Crespo, 2000: 215).

“Enquanto na primeira prática educacional o discurso mediador é primeiramente e às vezes exclusivamente o científico, na segunda o discurso mediador é ético-filosófico e a ciência apenas vem reforçá-lo através dos fatos que é capaz de constituir” (Crespo, 2000: 215).

“A educação ambiental não pode ser vista separadamente do movimento histórico, mundial, que a inspira e que denominamos de ambientalismo. O ambientalismo surge, na forma como o conhecemos hoje, na segunda metade deste século, logo após a 2ª Guerra Mundial. (…) Incorpora o conservacionismo, que é uma ideologia anterior, forjada no século XIX. Estrutura-se nos anos 60 e 70 à medida que o mundo se dá conta da degradação do ambiente e do uso predatório dos recursos naturais” (Crespo, 2000: 216).

“Como um movimento aberto a várias influências culturais, o ambientalismo também sofre, na construção histórica de seus argumentos, diversas clivagens ideológicas que o dividem internamente em uma grande diversidade de correntes” (Crespo, 2000: 216-217).

“Duas delas (…) a que constitui o chamado ambientalismo pragmático, também cunhado como ecologia de resultados; e o conhecido como ambientalismo ideológico, ecologismo profundo ou ainda ecologismo ético” (Crespo, 2000: 217).

“o ambientalismo pragmático está preocupado em frear o processo de depleção dos recursos e criar dentro dos sistemas sócio-econômicos vigentes, onde predomina o capitalismo, mecanismos que compatibilizem desenvolvimento econômico e manejo sustentável dos recursos naturais” (Crespo, 2000: 217).

“Para o ambientalismo ideológico, a questão é mais de fundo. Trata-se de questionar a própria relação homem-natureza historicamente dada e de ‘desconstruir’ a sua racionalidade, trata-se de substituí-la por outra. (…) a ideologia do abrandamento do processo de destruição não resolve (…) só uma mudança de sensibilidade, uma nova subjetividade, bases de um novo modo de pensar, podem evitar uma catástrofe maior” (Crespo, 2000: 217).

“A tese do ambientalismo profundo é de que a sustentabilidade não deve ter como referência o sistema produtivo ou os regimes políticos, mas sim partir de estratégias que visem mudar os paradigmas de racionalidade que orientam as sociedades e os seus sistemas sócio-culturais. Por isso, essa corrente prefere o conceito de ‘sociedade sustentável’ ao de ‘desenvolvimento sustentável’ dominante na vertente pragmática citada”. (…) aqui a sustentabilidade implica mais do que acreditar que a saída para o limite colocado pela esgotabilidade dos recursos será a inovação tecnológica somada a mudanças no padrão de consumo” (Crespo, 2000: 218).

“Que implicações tem as visões dessas duas principais correntes, ambas sustentabilistas, nas práticas de educação ambiental?” (Crespo, 2000: 218).

“(EDUCAÇÃO AMBIENTAL ORIENTADA PARA A MUDANÇA DE COMPORTAMENTO) (…) a primeira corrente tende a privilegiar o instrumental ‘behaviorista’, ou comportamental, estabelecendo uma relação direta entre a informação e a mudança de comportamento. Pressupõe que os indivíduos devidamente informados sobre as conseqüências danosas ou letais dos seus atos, e dominando corretamente os conceitos necessários à compreensão das relações entre o processo social e o natural, estão prontos para transformar hábitos e atitudes” (Crespo, 2000: 218-219).

“(…) há uma forte tendência em constituir um conjunto de ‘ciências ambientais’ e em investir de autoridade algumas disciplinas, especialmente a ‘geografia’ e a ‘biologia’. (…) freqüentemente praticada por agências governamentais e por escolas onde o modelo tecnicista prevalece, há uma constante preocupação com os indicadores de mudança e com o curto prazo” (Crespo, 2000: 219).

“Recentemente (…) está sendo praticada de modo associado à chamada ‘educação para a cidadania’, em que as questões ambientais, sobretudo aquelas afetas à vida das comunidades urbanas, aparecem como componente da cultura cívica dos direitos e deveres dos cidadãos” (Crespo, 2000: 219).

“(EDUCAÇÃO ORIENTADA PARA A MUDANÇA DE SENSIBILIDADE) (…) a desejada conscientização é um processo que passa pela construção de uma nova sensibilidade. Para seus adeptos, a problemática ecológica questiona os próprios fundamentos da civilização ocidental e coloca em xeque os argumentos unicamente baseados no racionalismo técnico-científico. (…) essa visão traz para a escola e para os educadores questões que não podem ser respondidas pelas disciplinas acadêmicas e pela grade curricular do ensino básico. (…) exigem um novo tipo de abordagem que privilegia a conjugação dos saberes e a inter-relação entre eles” (Crespo, 2000: 219-220).

“Promover o pensamento sistêmico e uma abordagem holista dos problemas, eis as tarefas cognitivas básicas da educação orientada para a mudança de sensibilidade. (…) Aqui, o discurso ético-filosófico tem tanta autoridade quanto o científico, sobrepujando-o em muitos casos. (…) impedem que prevaleça ora uma visão demasiado naturalizada do meio ambiente, em que se fala apenas da fauna , da flora e dos ecossistemas, ora demasiado socializados, o que interessa é a manutenção das condições de reprodução das sociedades humanas. (…) põe em xeque o confinamento dos educandos às salas de aula” (Crespo, 2000: 220).

“Privilegiando as pedagogias ‘experienciais’ ou ‘vivenciais’ essa tendência, praticada sobretudo por organizações não-governamentais ambientalistas e comunitárias, desenvolve estratégias diferenciadas segundo duas tendências internas. A primeira é mais voltada para grupos e comunidades da classe media, que desejam experimentar formas alternativas devida, praticando exercícios constitutivos de um novo campo cunhado de ‘ecologia da mente’. (…) A segunda tendência, mais próxima àquelas desenvolvidas pela educação popular-comunitária, é inspirada na pedagogia de Paulo Freire e discípulos. Tem como público-alvo principalmente comunidades de baixa renda” (Crespo, 2000: 220-221).

Educação e Desenvolvimento Sustentável na Agenda 21

“(A Agenda 21) Graças às suas proposições de contemplar tanto o curto quanto o médio e longo prazos. vem estabelecendo uma síntese entre as duas visões sustentabilistas já descritas, cunhando uma nova tendência que podemos denominar de ‘educação orientada para a sustentabilidade”. (…) representa o mais ambicioso programa de ação conjunta de países já produzido, com o objetivo de promoveu, em escala planetária, o desenvolvimento sustentável” (Crespo, 2000: 221).

“É o Capítulo 36 da Seção IV que leva o título ‘Promovendo a Conscientização Ambiental’ que trata mais especificamente da educação e do papel a ela reservado na promoção do desenvolvimento sustentável” (Crespo, 2000: 222).

“Também contempla a população adulta, falando em treinamento, desenvolvimento de habilidades para o trabalho e de aperfeiçoamento técnico. (Crespo, 2000: 222).

“(…) mais diretamente referido à educação ambiental, recomendando que seja ensinada desde a tenra idade até a fase adulta, e que integre os conceitos de meio ambiente e desenvolvimento” (Crespo, 2000: 223).

“para a Agenda 21, a educação para o desenvolvimento sustentável se resume em dois processos pedagógicos complementares: o primeiro seria o da ‘conscientização’, entendida como compreensão das relações entre sociedades humanas e natureza, entre meio ambiente e desenvolvimento, entre os níveis global e local; e os segundo como ‘comportamento’, visto como desenvolvimento de atitudes menos predatórias e de habilidades técnicas e científicas orientadas para a sustentabilidade” (Crespo, 2000: 223).

“Em várias partes do documento, ora a educação aparece como capacitação individual e dos grupos a serem reforçados, ora aparece como construção de uma nova sensibilidade e visão de mundo que deve se espraiar por todos os segmentos” (Crespo, 2000: 223).

Educação voltada para a sustentabilidade

“A Agenda 21 (…) promove uma série de valores que deverão estar presentes em uma educação orientada para a sustentabilidade.

a) Cooperação: (…) entre países, entre diferentes níveis de governo, nacional e local, e entre os diferentes segmentos e atores sociais;

b) Igualdade de direitos e fortalecimento dos grupos socialmente vulneráveis: (…) buscando não só para estes grupos a básica igualdade de direitos e de paricipação, como trazer par ao processo a contribuição valiosa e específica de cada um deles em termos dos seus valores, conhecimentos e sensibilidade;

c) Democracia e participação: (…) o emprego de metodologias participativas na busca de consenso (…) instrumento extraordinariamente reforçador dos ideais democráticos, em que a igualdade de direitos, o combate à pobreza e o respeito a diversidade cultural (…);

d) A sustentabilidade como uma ética: (…) estabelecendo definitivamente a noção de que não haverá sustentabilidade ambiental sem sustentabilidade social e vice-versa. (…) a

sustentabilidade para ser alcançada exige estratégias em escala planetária de combate à pobreza, à intolerância e à beligerância.” (Crespo, 2000: 224).

“(…) a constituição dessa tendência, consagrada pela Agenda, aparece como uma síntese de várias outras que foram surgindo no processo recente de construção histórica dos conceitos e práticas do ambientalismo mundial” (Crespo, 2000: 225).

“(…) o programa da Agenda 21 (…) tem o mérito de articular os vários conceitos que vinham sendo forjados em diferentes correntes, fornecendo uma consistente grade de valores e de estratégias. Evitando tanto a formulação fundamentalista quanto a economicista da sustentabilidade, ela nos fala de ‘sociedades sustentáveis’” (Crespo, 2000: 225).

“Sustentabilidade, entendida como um equilíbrio dinâmico entre as necessidades das sociedades humanas e a capacidade da natureza de satisfazê-las, respeitados os processos metabólicos e cultural-simbólicos implicados nesta relação” (Crespo, 2000: 225).

“As sociedades sustentáveis combatem o desperdício, levam em conta o processo coletivo, e o bem comum sem violar os direitos individuais da pessoa” (Crespo, 2000: 225).

“O papel da educação ambiental nas sociedades que ainda não são sustentáveis, é o de propiciá-la. (…) Atribuindo à educação ambiental um papel crucial, porém não salvacionista, a educação orientada para a sustentabilidade é processual, e plasmada ainda numa cultura de transição. Necessariamente terá que contar com instrumentos, pedagogias e objetos de cultura que ainda fazem sentido em um mundo regido pela lógica da insustentabilidade” (Crespo, 2000: 225-226).

“A Agenda 21 e o programa da sustentabilidade traçam um caminho e sugerem um papel aos educadores que só a educação orientada para a sustentabilidade pode cumprir.” (Crespo, 2000: 226).

“[A Agenda 21 aproveita] o que há de melhor, em termos dos valores que foram sendo nas várias tendências do ambientalismo e que rebateram na educação (tais como a ‘educação experencial’, a ‘educação ambiental política’ e a ‘educação para o desenvolvimento sustentável’)” (Crespo, 2000: 226).

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Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

3 thoughts on “Fichamento de artigo de Samyra Crespo: Educar para a sustentabilidade

  • 02/05/2009 em 08:57
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    Muito bom para mim que estou fazendo uma monografia dentro da perspectiva da Ecoteologia e gostaria de ter mais dados e estes artigos e informações ajudam muito.

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  • 14/03/2010 em 18:56
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    Penso ser muito relevante esse trabalho exposto aqui, para mim uma pessoa muito ocupada que tem que trabalhar 16 horas, não sobra tempo para leituras, e com essa contribuição posso me atualizar e fazer o que mais gosto, estar por dentro de literaturas importantes e relevantes. muito obrigada.

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  • 04/05/2010 em 19:52
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    Foi muito importante para mim encontrar essas informações para me orientar diante das duvidas sobre com fazer um artigo obrigadaaaaaaaaaaaaaaaaa é muito bom saber q existe pessoas q fazem a diferença abraços! Luciana último ano de pedagogia Uninove Santo Amaro.

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