Esta educação nunca vai dar certo!

Esta semana foi de reaparecimento na escola. Ressurgimento das cinzas. Falarei sobre a escola do município do Rio de Janeiro, onde tenho matrícula e estou em sala de aula.

Vejam só o que vos digo: esta educação nunca nunca nunca vai dar certo! Por mais planos mirabolantes que se tenha, não vai. Não adiantam choros nem velas, ciclos nem série.

Na 2a feira topamos com um novo diretor. Lá, após uns dois anos de caos, com uma direção de concenso dos professores sendo praticamente expulsa pelo órgão central, loucas na direção e a escola quase em surto coletivo, estávamos com uma direção que começou a dar um jeito, em conjunto com o corpo docente.

Pois bem, esta direção foi, na calada das férias, expulsa – tá virando rotina – e outra empurrada pela nossa garganta. É a democracia dos DEMocráticos, se é que me entendem.

Lá nesta escola sempre se fez o horário no quadro, nós mesmos, com todos os professores presentes, um a um, por ordem de antiguidade. Claro que não agradava a todos, mas era um método de certa forma criterioso e permitia que escolhêssemos, trocássemos, discutíssemos, etc.

Mesmo na época que lá entrei e, portanto, sendo praticamente o último (na frente apenas das duplas regências, cessões e empréstimos) sempre consegui o horário que queria.

Mas este diretor novo chegou com a brilhante idéia de fazer ele mesmo, só, sozinho, o horário dos mais de 40 professores.

Sem conhecer-nos, só solicitou as nossas preferências de dias da semana e turno.

Claro que não podia dar certo. Quem se dá bem com o 9o ano (8a série) ficou com 6o ano (5a série), eu queria pela manhã ficarei à tarde, quem fazia manhã e tarde não faz mais e por aí vai.

E mais: ele teve também a idéia brilhante de colocar as séries iniciais para tarde e as mais avançadas para manhã. Que que acontece? Uma escola em que todas as séries tinham pela manhã e pela tarde, através da cabeça de uma só pessoa que acaba de entrar, muda seu ritmo. Alunos que já estavam com a vida toda organizada para um determinado turno, com cursos e até mesmo trabalhos, não têm agora opção de horário.

Bomba.

Por que digo isto prezades amigues? Porque esta piiiiiiiii de escola não pode dar certo. Este sistema, esta estrutura de escola não pode dar certo.

Já falamos aqui sobre alguns aspectos do educacídio que se faz no Brasil, mas falarei aqui, em breves palavras, quase gritando, sobre mais um…

A ESCOLA NUNCA VAI DAR CERTO COM O CORPO DOCENTE TRABALHANDO APENAS ALGUMAS HORAS EM CADA VÁRIOS LUGARES QUE TRABALHA!

Simples.

O professor, em geral, tem 16, 20, 22 horas de trabalho em cada escola. A maior parte em sala de aula (em horas/aulas, menos que 60 minutos) e outra parte pra fazer “planejamento”, horário que não é necessariamente cumprido dentro da escola.

Como ele não é dedicação exclusiva, o salário também não o é, correto? Assim, temos nós que ter outros empregos, correto? Outras escolas ou até mesmo outras atividades.

DESTA FORMA NÃO VAI DAR CERTO! Repito.

Assim é difícil se entregar ao trabalho e se envolver com a escola, com seu público. Imagine um professor, por exemplo, que pegue 4 turmas em cada escola e que trabalhe em duas (Estou sendo generoso, pois muitos trabalham em 3, 4 ou mesmo 5 e têm 4 ou 6 turmas em cada). Neste caso são 8 turmas. Considere uma média de 30 alunos por cada, sendo também generoso, pois muitas têm mais de 40. São 240 alunos! Na melhor das hipóteses!

Você acha realmente, queride amigue, que este professor pode conhecer todos os seus alunos? Saber de sua história, conhecer sua família, seus gostos, suas dificuldades, suas habilidades, onde e como vive, do que ele não gosta, qual o seu potencial, se ele está de fato apreendendo o conteúdo e construindo conhecimentos significativos e duradouros?

Ora ora… todo manual de pedagogês diz que é preciso fazer isso… Mas como?

Simples…

O professor – descobri a pólvora e a roda juntos! – têm que ser contratado, e pago, para ser de uma só escola! Para dar suas 40 horas semanais de trabalho em um só lugar. Mas não apenas para enclausurá-lo em sala de aula para repassar seus incríveis conhecimentos aos alunos, mas para dar aulas; para planejar de fato; para se encontrar e discutir com os colegas; para pesquisar no computador; para fazer grupos de estudos com alunos; para receber e cuidar individualmente ou em pequenos grupos dos alunos com mais dificuldades; para receber e conversar com os responsáveis com calma; para desenvolver projetos; para desenvolver oficinas diversas; para pesquisar, escrever, relatar e refletir sobre sua prática…

E por outro lado, óbvio, os alunos têm que passar mais tempo na escola. Começar às 7 horas da madrugada é uma tortura para qualquer um. E ser praticamente expulso ao meio-dia para ficar sabe-se lá onde sabe-se lá com quem, é uma piada.

Aliás, a educação no Brasil é uma piada.

Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

26 thoughts on “Esta educação nunca vai dar certo!

  • Pingback: Declev via Rec6

  • 16/02/2008 em 12:07
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    Parabéns ! Mais uma vez um artigo que vai direto ao ponto. Não tem mágica não. Se não começarmos pelo óbvio, Professores bem pagos e com dedicação exclusiva em uma só escola, não chegaremos a lugar algum.

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  • 16/02/2008 em 23:02
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    No Brasil não vai dar certo nunca porque sempre haverá um “jeitinho brasileiro” para transformar boas idéias e leis em mamatas e sacanagens. Niterói, a “cidade educadora”, é um ótimo exemplo, não?

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  • 17/02/2008 em 12:38
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    A sua “reinvenção” da pólvora e da roda me parecem tão evidentes e simples que eu fico me perguntando: que diabos andam ensinando nas Faculdades de Educação deste país?…

    Eu não consigo ser paranóico a ponto de acreditar que existe uma “conspiração” por trás disso… é apenas burrice, mesmo!…

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  • 18/02/2008 em 09:37
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    Se fosse só burrice acho que seria mais fácil, João.

    Começa por uma questão de investimento: para fazer isso precisa-se de mais dinheiro e mais dinheiro bem aplicado.

    Aí, como diz o Rogério, não daria pra transformar boas idéias e leis em mamatas e sacanagens…

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  • 18/02/2008 em 15:03
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    Rapaz tem uma coisa sendo esquecida nisso tudo…qual país do mundo, com a corrupção como a nossa, em q só os poderosos se dão bem, em q quem tem dinheiro tem poder com mamatas correndo debaixo do pano, com podridões q a mídia coloca da forma como ela quer colocar, entre outras coisas…qual país do mundo vai querer q o povo saiba de alguma coisa, q o povo tenha conhecimento p cobrar, q se tenha respeito pelo povo…o q eles querem é que os alunos passem sem ter conhecimento, sem saber de nada e q continuem sendo enrolados com novelas e BBBs ano após ano…nós como professores temos a obrigação, em qualquer condição de repassar não só nosso conhecimento como tambem os ensinar mesmo aos poucos o que deve ser ético.

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  • 18/02/2008 em 18:29
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    Então a conspiração está em nível mundial… Eu estou traduzindo um artigo, publicado no Washignton Post de domingo, que diz claramente: “Somos um país de ignorantes!” e está falando dos EUA, com seus bilhões de dólares e “trocentas” Universidades de altíssimo nível…

    Já começam a passar por minha cabeça idéias Malthusianas… Parece que há gente demais no mundo e, não importa o que se tentar fazer, a estupidez geral vai chegar a uma “massa crítica”. Após a inevitável catástrofe, talvez seja possível educar condignamente os sobreviventes…

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  • 20/02/2008 em 12:33
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    Concordo contigo, mas quando será essa catástrofe??? A verdade é que,por incrível que possa parecer em muitos aspectos os americanos, grande maioria, são realmente ignorantes, principalmente no que diz respeito a geopolítica. Recentemente conheci um americano, que as vezes vem ao Brasil, como ele diz, e não deixou de admitir que lá eles são quase q totalmente tolhidos de informação, principalmente no aspecto Iraque, no qual eles evitam informações a respeito de morte de soldados, entre outras coisas e que só fora do país e que conseguiu mais informações.Lembro bem da revolta q meu pai tinha quando era obrigado a lidar e viajar, por motivo de trabalho, aos EUA. Enfim, espero ser um dos sobreviventes, pois ainda tenho muito o q aprender, apesar de querer ensinar…Um abraço

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  • 20/02/2008 em 16:42
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    Hilário: Talvez essa catástrofe já tenha começado e nem tenhamos nos dado conta… O tom da introdução do Relatório do IPCC é sombrio: “Temos as opções de viver em um mundo danificado, ou em um mundo muito danificado”…

    Embora o Relatório do IPCC afirme que os mais atingidos serão as populações atualmente mais carentes, eu tenho cá minhas dúvidas quanto à sobrevivência de uma civilização que se apóia no consumo desenfreado de recursos não renováveis.

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  • 22/02/2008 em 08:43
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    Ôpa! Estamos entrando numa área que eu também gosto: a educação para o meio ambiente… Tem razão, o relatório do IPCC é catastrófico; as populações carentes serão as mais atingidas e esta civilização consumista não se mantém.

    É justamente por conta de todos estes fatores até aqui discutidos e outros ainda, que a educação – e a educação ambiental propriamente dita – não devem se basear somente em aspectos comportamentais… “coloque seu lixinho na latinha…”.

    Deve-se abranger os aspectos políticos, sociais, culturais… mas aí, concordando com Hilário, quem vai querer? E concordando com o João, nem os americanos! Não é à toa que eles são tão ignorantes em muitos aspectos. Desta forma eles elegem o Bush, apóiam uma guerra de mentira, acham que são a salvação do mundo contra o terrorismo, são os mais consumistas do mundo, são gordos e alienados… com exceções, é claro.

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  • 25/02/2008 em 14:08
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    Infelizmente, são poucas pessoas q tem essa consciência e essas poucas pessoas são esmagadas por todos os lados. Além do mais, vocês já repararam a quantidade de propagandas divulgadas na tv sobre questões q se tornaram responsabilidades nossas??? A algum tempo aparecia na tv propagandas sobre “seja um Amigo da Escola”…isto é, pedindo ajuda da comunidade p/ reforma da Escola. Tudo lindo, maravilhoso, mas com o passar do tempo o governo começa a “colocar culpa” das mesmas caindo aos pedaços na própria comunidade e com isso se eximindo de culpa. Sinceramente, gostaria de enxergar algum dia a frase “sou Brasileiro e não desisto nunca” sem ironia… ou quem sabe sarcasmo de Governos que sem sombra de dúvidas preferem e muito aparecer “bem na fita” lá fora e nos colocar debaixo do tapete…o IPCC não nos deixa mentir…Até a próxima!!!

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  • 27/02/2008 em 11:44
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    Care amigue, como você sabe, sou jornalista e venho me aventurando como professor. Dou-me alguma autoridade para comentar o seu artigo pelas semelhanças entre os problemas entre as duas profissões.
    Permitam-me primeiro vou falar do periodismo. As empresas que têm dinheiro pagam o suficiente para ter o profissional com exclusividade. O melhor jornal do Rio (o que não significa grande coisa) tem até cláusula proibindo que o repórter assine matérias em outros veículos.
    Só que a maioria esmagadora de nós – não tenho dados estatísticos – faz “frilas”, que são os “free-lancers” aportuguesados, para completarmos nossos rendimentos. Então não pesquisamos, não aprofundamos as reportagens, cometemos erros por sermos superficiais.
    Estou dando aulas aos sábados, num projeto do Governo do Estado que mais à frente o Declev me deixa explicar aqui. Ministramos o conteúdo apenas em um turno, mas os organizadores nos pedem que fiquemos presentes o dia todo. Calma, não riam, colegas que trabalham em meia dúzia de escolas nos três turnos e só chegam em casa para dormmir. Não é fácil também para quem trabalhou 12 horas por dia na redação, fora a preparação extra e os frilas.

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  • 27/02/2008 em 11:45
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    Declev, não dá pra editar o texto depois que está publicado, né? Não revisei antes! hehehe

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  • 12/03/2008 em 10:09
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    Concordo em “quase” tudo mas (como você mesmo diz: Sempre tem um “mas..”) não entendi a insinuação à respeito dos DEMocráticos?

    O que tem eles a ver com isto?

    No mais… VALEU!

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  • 12/03/2008 em 17:23
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    Oi Fabinho, não tinha te “visto” por aqui… mas é isto mesmo, quem quer um bom profissional, deve pagar por ele.

    Oi Herculano, A piadinha com a democracia dos DEMocráticos tem a ver com o prefeito, que é deste partido, e com seus indicados nas Coordenadorias Regionais, que “indicam” a direção, sem eleição entre alunos, professores e responsáveis, como convém em um estado democrático.

    Abraços a todes.

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  • 12/03/2008 em 22:37
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    Como convém em um estado democrático, na cidade educadora (Niterói – governo do PT) teve eleições para direção ano passado, e na maior escola do município (Paulo Freire, no Fonseca) os números foram (são duas urnas, cada uma valendo 50%):
    chapa vermelha – 78 (professores e funcionários) e 161 (pais e alunos)
    chapa verde – 38 (professores e funcionários) e 405 (pais e alunos)
    Quem levou?

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  • 09/08/2008 em 21:59
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    Declev, olá!
    Que saudades da Professorinha,
    Que me ensinou o B A BA …
    Bons Tempos aqueles !!! Comecei o curso Primário aos 7 anos de idade! Pude ser criança! Pude ser filho de uma Dona-de-casa! Pude curtir o único período da vida sem preocupação e sem responsabilidades, graças à Deus!E olha que eu sempre fui Classe Baixa Média! se me indente.
    Tudo isto só para falar da minha sorte em ter sido educado por uma única professora ( Dona Cecília ) ao longo dos cinco anos do Curso Primário.
    O horário era das sete às doze horas.Minha Escola (Azevedo Sodré)era Pública, tinha refeitório para a merenda e possuía até uma Dentista permanente! A minha Professora tinha dedicação exclusiva não somente para com a Escola, pois Minha Professorinha também se dedicava exclusivamente aos seus Alunos …
    Quem sabe aqueles bons tempos possam vir a ser ressuscitados?
    Abraços à todos!
    Somel Serip
    somelserip@gmail.com

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  • 10/08/2008 em 22:45
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    É isso Somel,

    Professores com dedicação exclusiva.

    Mães com dedicação exclusiva.

    Não temo nem um nem outro.

    Quem educa as crianças?

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  • 07/01/2009 em 21:19
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    Parece que vc trabalha na mesma que escola que eu… A diferença é que estou em Brasília…

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  • 24/06/2009 em 11:56
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    Grande texto, Declev!
    Concordo em número, gênero e grau!
    Como orientadora educacional também acho que nosso horário é pequeno, o que dificulta demais o trabalho. Dedicação exclusiva a uma só escola, com salário compatível, seria realmente o ideal. E temos que dar conta de TODOS os alunos (na minha escola anterior eram mais de mil alunos e, nessa, são quase 250), contactar suas famílias mil vezes, procurar entender o lado do aluno, o do professor, o do funcionário de apoio, o da direção… E tudo isso pra sermos, muitas vezes, tratados como “teóricos” demais ou “bonzinhos” demais ou “limitados” demais, a cada vez que procuramos realmente ORIENTAR. educativa e pedagogicamente. toda a comunidade escolar (entram aí as famílias também, óbvio), o que é claro que é IMPOSSÍVEL de ser feito se não houver adesão e colaboração de todos em um projeto comum.
    Mas reclamar é mais fácil do que trabalhar em equipe…
    Realmente, desse jeito, a educação nunca vai dar certo!

    Resposta

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